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Sunday, October 29, 2006

ESPAÇO POÉTICO


o gasto da semente I

Tuas mãos na água devolvem terra
à semente a plebe absorve a mente
dessa água temporal à forja da
semente esclarece a revolta e
o novilho amordaçado nos braços
da tempestade

o gasto da semente II

Tuas mãos na água recolhem terra
à boca, gesto pastoral, pacífico e
dá lugar à semente, deposita a
nuvem na pálpebra
onde irás buscar o coração
o novilho informal,

(n)os olhos da plebe



o gasto da semente III

deste verso refaço o poema da plebe. Este
mundo fortaleço da polpa dos meus dedos
quando escrevo com o coração na lavra;
ainda a página imortal - não calo o
meu idioma

nem esses ventos que recolho do mote
e palavras diminutas, sôfregas,
levadas à boca e cantadas no andar
da ovelha que ofereço à página.

ELA ARDE

os sonhos dela ardem e tornam-se vivos
vivos os nervos entre gotas do incêndio.
- ela arde e transpira os comícios à beira do leite.
virei beber o lume do seu corpo suado;
virei porque o amor arde de febre e não tem cura;
virei porque ela chora de branco apeada sobre a
própria noite. e vejo o seu corpo renovado.



AMAR DEMAIS

cantar rochas amar demais
entrar na revolução
como uma erupção

abordar o perfil de
dureza
com delírios de vida
e vagas explosões

desses barcos sufocados
pela vida
e rochas do homem

mal dizem os saberes:
quem canta rochas
vulcaniza a próstata.

Wednesday, October 25, 2006

EU E A CRÍTICA

Tenho imenso apreço à crítica literária como estimo, por exemplo, a anátomopatologia no conjunto das disciplinas médicas. Com exagero ironiza-se de que o anátomopatologista (especialista que analisa alterações de células, tecidos e orgãos de pessoas doentes ou em estado post-mortem) chega sempre tarde. Mas a verdade é que ele acaba sendo o crítico da medicina, tal como a crítica literária é a consciência da literatura. Tudo que existe na arte, na ciência, na religião e outros domínios correlacionados, suscita uma teoria a partir da qual se exploram premissas para a sua compreensão factual, desenvolvimento, implantação, estabilização ou aceitação como fenómeno social, ou seja existencial etc.. É nesse contexto que vias se impõem para a absoluta necessidade da crítica, do ensaio e do jornalismo cultural.
No caso específico de J.T. - esse vosso criado -, a crítica esteve desde o início da sua formação literária sempre presente e querida. Para si, o problemático reside fundamentalmente no facto de que nem sempre a crítica é exercida por pessoas competentes para tal, por um lado, e por outro lado pode se defraudada conforme a(s) conveniências(s).
Não me preocupa qualquer crítico posto que olho com suspeita os poetas que também são críticos literários. Em alguns destes (e não são poucos), existe uma tendência para salvanguardar semelhanças que decorrem de escolas, grupos ou correntes ligadas à sua forma de fazer poesia (estilo), exibindo critérios, rotulando com agravo outros estilos. Essa imposição de formas e critérios soa-me a exercício de sobrevivência, uma actividade cerebral pouco ou nada percebida, que pode ir desmanchando compromissos com a própria arte, a serviço irrisório do autoconsumismo ou duma metódica autopromoção. Tenho por isso cuidado de separar o crítico que depois faz poesia, do poeta que envereda pela crítica (com respeito daqueles que evoluem concomitantemente um e o outro). O primeiro apoia-se por uma actividade primariamente académica, com a isenção que deverá conservar antes e depois da sua poesia; o segundo é suspeito na medida em que o exercício da crítica surge aqui e algures como uma actividade acessória, se importando amiúde ante a lógica que imana da diversidade estilística do conseguimento estético. É logico...

Monday, October 16, 2006

Sunday, October 15, 2006

Sobre a obra surreambulando de João Tala, Isaquiel Cori, contista e jornalista considerou o seguinte: "essas narrativas, essas jóias de ficção, vêm interpelar as nossas consciências e dizer_nos ainda coisas dos dias dos tumultos. são evocações necessárias, incontornáveis e indispensáveis no esforço que deve ser feito para a "purificação" das nossas almas de de angolanos. a memória dos dias e anos de tumulto há-de subsistir e tem de subsistir sempre, na medida em que a reconciliação nacional não pode ser feita pela via da amnésia colectiva. Este livro, surreambulando, situa-se na tradição literária nacional de abordagem da realidade social sem peias nem contemplações e relança e traz à tona o papel do escritor enquanto consciência crítica e "voz dos que não têm voz".

Thursday, October 12, 2006


Rio de Janeiro, 12/10/06


caso vc ainda me ature, deixa-me adverti-lo que será frequente neste blog o uso alternado das primeira e segunda pessoa do singular; talmente maiúscula/minúscula.
J. T., 46, natural de Malanje (Angola), médico nas horas ocupadas, escritor de lazer (na verdade ele queria ser folgazão e foi traído pelas palavras; tinha de começar por alguma, nem que fosse palavra noite), é membro da União dos Escritores Angolanos. publicou:

1. a forma dos desejos (poesia) 1997
2. o gasto da semente (poesia) 2000
3. a forma dos desejos II (poesia) 2002
4. lugar assim (poesia) 2004
5. a forma dos desejos (contos) 2004
6. a vitória é uma ilusão de filósofo e de loucos (poesia) 2005
7. surreambulando (contos) 2006, aguarda lançamento


algumas das obras acima valeram prémios literários. darei um dia meu parecer sobre premiações literárias, aguardem-me por favor.
estive agora mesmo a verificar meus cadernos de rascunho, onde geralmente escondo à lápis rigoroso minhas ideias, poemas, contos, notas de meus tormentos, negativas da história, pedaços amargos e coisas parecidas. dos meus cadernos que parecem escombros, encontrei:

tudo parece que foi ontem

por um dia de parto escreve-se um
comício:
tudo parece ontem o hospital e
o paraíso. os mesmos anjos no
limite d'ervas.
estamos reunidos com o doutor do
mundo
ninguém escreverá uma dor que seja.

(inédito)

no meu caderno de palavras prosseguem os rascunhos, certo dia que ouço o barulho que vem da cozinha, os curtos passos de uma mulher atarefada, atarantada, bailo naquele átrio, o barulho próprio das cozinhas, a imaginação compõe uma orquestra. inédito absorvível, provavelmente ainda não concluído. eis...

LABORATÓRIO

Tagarelando a orquestra teus utensílios
cada vez mais teus sons o toque de um copo
uma tampa rolando o ruído da frigideira
tangível teu corpo deste ímpeto informe
mãos no olfacto som no paladar,
água na fervura. você me aquece,

cheia de temperaturas
em todo teu corpo houvera uma tempestade:
o corpo candente
a farinha branca
a panela a ferver e eu a ferver

fogo no espírito, operária
de novo venho entregar-me
faço parte dessa fórmula secreta
aprontada em ponto de fogo.

(inédito)

Wednesday, October 11, 2006

BEM VINDOS AO BLOG DE JOÃO TALA

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para iniciar ofereço desde já dois poemas inéditos da minha lavra. prosseguirei à medida do tempo com notícias de mim, notinha biobibliográfica, opiniões e mais trabalhos literários.
finalmente pelo caminho encontro a
mulher que também é um caminho

Aguardada no templo cavaqueada nas assembleias
ela finalmente chegou e trouxe o caminho.
Ela está aqui ébria de pátrias
escava meu recinto,
na circunstância do meu púbis.
Demora um caminho dentro de si
e todo o caminho é uma circunstância!
Conheço o atalho dentro dela.

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liberta-me do esquecimento, mulher


Ela solta o corpo o texto animal
e frutos avultados

Quando prontos os frutos
bebo-lhe noites o odor da manada.

A ela devo as coisas mais elementares:
o suspiro libertador
a primeira água e,

o evangelho deste corpo intacto e húmido;
a água acumulada no meu celibato
como o amor noúltimo cuspo.

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do livro inédito
"tratado d'escombros & traumatologia"